A verdade é que, enquanto tivermos uma legislação que incentiva essa esculhambação, seguiremos vendo políticos tratando partidos como camisetas que se trocam a cada rodada. E nós, eleitores, continuaremos na arquibancada, torcendo por um time que talvez nem exista mais na próxima temporada. Por isso tinha razão o escritor Eça de Queiroz ao afirmar que “políticos e fraldas devem ser trocados frequentemente, e pelos mesmos motivos”.
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Por: Luiz Lunardelli
Se tem algo que brasileiro gosta, é de futebol. E política. Mas não a política séria, comprometida, com ideais bem definidos. Nada disso! O que faz sucesso por aqui é a política estilo transferência de jogadores: um grande mercado de contratações onde os “esportistas do oportunismo” pula de um time para outro com a mesma convicção de um atacante que beija o escudo do novo clube cinco minutos depois de assinar contrato. Sim, estamos falando da famigerada janela partidária, essa criação genial da nossa legislação que transforma deputados e vereadores em verdadeiros turistas ideológicos.
E Biguaçu parece ser palco de mais uma dessas mudanças. Circulou nas redes uma foto do vereador Izaquel Zuffo (PSD) ao lado do Secretário de Obras Lucas Manequinha (PMDB) e do ex-vereador Claudemir Aires (PSD), sendo recebidos pelo presidente da Assembleia, deputado Júlio Garcia (PSD). O trio, oficialmente, foi pedir recursos para Biguaçu, mas nos bastidores, já pipocam especulações: Manequinha estaria ensaiando o retorno ao PSD para ser candidato a prefeito. Seria a jogada estratégica para romper o acordo entre PMDB e PODEMOS, onde o atual prefeito Salmir Silva busca vaga na Assembleia e o vice, Alexandre Martins, assumiria os dois últimos anos do mandato sem reeleição.
A mexida é arriscada, pois o PMDB não pretende abrir mão da cabeça de chapa, em 2028, enquanto o PODEMOS, já enfraquecido com a saída do presidente Jefinho Binhotti, parece estar na UTI política. O eleitor, como sempre, assiste a esse vaivém partidário com a mesma expressão de quem descobre que seu time do coração acabou de vender o ídolo para o rival. Mas, convenhamos, fidelidade partidária nunca foi o forte dessa turma. Trocar de sigla virou praxe, e enquanto isso, seguimos torcendo por um time que talvez nem exista mais na próxima temporada.
A cada dois anos, abre-se essa mágica oportunidade para que os políticos de mandatos proporcionais possam trocar de partido sem nenhuma penalização. Sem justificativa, sem remorso, sem olhar para trás. Quer dizer, sem olhar para trás só até onde está o caminho do cofre mais cheio. O discurso é sempre o mesmo: “meu antigo partido não representa mais os meus ideais”, “a direção tomou rumos que eu não concordo”, “o partido estava me perseguindo”. E então, como um passe de mágica (ou um pix bem gordo), o indignado se aconchega na sigla rival, jura amor eterno às novas cores e segue a vida, até a próxima janela.
Para o eleitor, fica a sensação de ser um trouxa que compra um ingresso para ver um time e, no meio do jogo, descobre que os jogadores resolveram vestir a camisa do adversário. Afinal, aquele vereador que você elegeu por determinado partido, com determinada promessa, pode muito bem estar defendendo algo completamente oposto dali a poucos meses. E ninguém pode fazer nada, porque a lei permite. Fidelidade partidária? Isso é coisa para românticos desinformados. O negócio agora é ser pragmático, “realista”, flexível como um camaleão em crise de identidade.
Mas nem tudo está perdido. No futebol, existem os raros casos de jogadores que dedicam toda a sua carreira a um único clube, tornando-se verdadeiros ídolos, exemplos de lealdade e compromisso. Pelé no Santos, Rogério Ceni no São Paulo. Na política, também temos alguns (poucos) exemplos de figuras que se mantiveram fiéis a suas legendas, sem ceder às seduções do mercado da infidelidade caso específico dos Progressistas, Esperidião Amin, Leodegar Tiscoski e José Castelo Deschamps, ou dos peemedebistas Luiz Henrique da Silveira e Pedro Ivo.
Enquanto isso, a maioria dos nossos "craques" da política segue seu campeonato particular, disputando quem troca de time mais vezes sem parecer descarado demais. O eleitor, esse bobo da corte da democracia, continua aplaudindo ou, na melhor das hipóteses, reclamando nas redes sociais sem tomar atitude alguma. Afinal, reclamar é de graça e votar com consciência dá trabalho.
A verdade é que, enquanto tivermos uma legislação que incentiva essa esculhambação, seguiremos vendo políticos tratando partidos como camisetas que se trocam a cada rodada. E nós, eleitores, continuaremos na arquibancada, torcendo por um time que talvez nem exista mais na próxima temporada. Por isso tinha razão o escritor Eça de Queiroz ao afirmar que “políticos e fraldas devem ser trocados frequentemente, e pelos mesmos motivos”.
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